Sobre a modalidade
A escalada pode ser definida como uma progressão, com possível risco de queda, num terreno rochoso, nevado, gelado ou misto, de inclinação acentuada, na vertical, em subprumo ou mesmo em tecto, usando os pés e as mãos e geralmente também material de segurança e/ou progressão.
O acto de trepar remonta às origens do homem, mas é usual considerar que a escalada começa a ser praticada com as primeiras ascensões sistemáticas nos Alpes (século XVIII), confundindo-se com a própria origem do alpinismo, de que é disciplina base: escalada em rocha, terreno misto, neve e gelo. As técnicas de escalada em rocha desenvolveram-se um pouco tardiamente em relação às técnicas de neve. Até aos anos 80 do século XX, os alpinistas centraram a sua atenção na conquista das mais altas montanhas dos Alpes pelas vias mais acessíveis, sendo estas raramente rochosas. As primeiras escaladas no Meije e posteriormente no Grépon (maciço do Monte Branco) marcaram a transição para itinerários com partes rochosas.
Apesar do termo “alpinismo” se aplicar à actividade de escalada ou ascensão em (alta) montanha, seja qual for a região do Globo onde se pratique, em Portugal esta actividade é designada por montanhismo. Desportos como a mountain bike ou o parapente, ao aumentarem o leque de modalidades praticadas em montanha, vieram, no entanto, diluir as disciplinas de índole montanheira (tradicionalmente, escalada, marcha, esqui e campismo ou bivaque) no seio de uma profusão de novas abordagens do meio, sendo costume falar-se em “actividades de montanha”.
Por outro lado, a escalada em rocha, tendo-se expandido para além do “terreno de jogo” montanhoso, pratica-se em falésia (onde a escalada desportiva atrai um grande número de adeptos), blocos (designando-se “bouldering”) e edifícios ou muros de escalada (buildering). A escalada em falésia é prática antiga: no século XIX, os alpinistas alemães treinavam nas torres areníticas da Suíça antes de enfrentarem as grandes paredes dos pré-Alpes austríacos ou das Dolomitas e o escalador inglês Alfred Mummery, considerado o pai da escalada acrobática, tinha igualmente o interesse pelas falésias numa perspectiva de treino.
Hoje em dia, os montanhistas (ou melhor, os montanheiros) continuam a escalar em falésias, praticando, numa perspectiva de treino e/ou lazer, a escalada livre (free climbing) e a autoprotecção (colocação de pontos de seguro), a fim de atacarem vias rochosas em montanha ou alta montanha. Em escalada limpa ou ecológica (clean climbing), uma variante da escalada livre resultante da escola de Yosemite Valley (Califórnia), utiliza-se somente autoprotecção com seguros que não danifiquem a rocha: vias abertas a entalador. Em escalada desportiva (outra variante da escalada livre) buscam-se as altas cotações ao longo de vias curtas (geralmente 20 a 30 metros de altura ou raramente ultrapassando três largos), equipadas com seguros fixos (spits, pernos ou tiges) e, por vezes, em situações extremas, as expresses, colocadas previamente. Diferentes concepções!
O “terreno de jogo” possibilita múltiplas abordagens da rocha e o essencial em escalada é que esta se pratique com satisfação e segurança.
Devido à intensa componente física (e psicológica) que a escalada comporta, esta é considerada um desporto. No entanto, até aos anos 80 do século XX, altura em que surgem os primeiros campeonatos de escalada na Europa Ocidental, não se considerava essa actividade como sendo um desporto, por não existirem competições convencionais comportando classificações, eliminatórias, árbitros e um público sempre pronto a aplaudir. As competições desportivas, ao desenrolarem-se, em geral, em recintos equipados segundo normas e regras precisas (tal como acontece actualmente na escalada in-door) contrastam marcadamente com a escalada em paredes rochosas na vastidão da Natureza pura e selvagem.
Trepar é, quando o terreno o exige, a única forma de progredir. No entanto, para escalar uma parede rochosa é necessário conhecer os equipamentos e as técnicas empregues. E, sobretudo, “saber fazer”. O domínio das técnicas usadas é imprescindível para aqueles que se aventuram na vertical. A recompensa traduz-se nas ímpares vistas panorâmicas. Escalar, para além da componente física, será também atracção pela liberdade dos vastos espaços verticais, pela grandiosa beleza do mundo mineral, pela simplicidade e rusticidade. Como disse o grande alpinista italiano Walter Bonatti (1962): “Um fraco desejo de regressar lá ao alto surge um dia em nós. Assim recomeça o encantamento”.
(P.C., Jun. 2013 / adaptado de Guia de Montanha – Manual Técnico de Montanhismo I, 2010)